A Editora Edições Esgotadas lançou a trilogia de Lisa Santos Silva.
Ocorreu no passado dia 20 de maio 2023, no Museu Nacional de Soares dos Reis, na cidade do Porto, terra natal da artista.
A trilogia conta com “Retrato de Eva Friedman” , “Kitch” e “O Vestido”, são três magnificas obras que nos encantam e remetam para atmosfera densa.
Disponíveis em www.edicoesesgotadas.com
Sobre a artista:
“Lisa Santos Silva define-se assim – Parisiense de adopção, portuguesa sempre, pintora, uma vida ligada à História Africana de Portugal. Na sua beleza. Nas suas tragédias. Muitas vidas numa só …
A vida de Lisa daria certamente um filme. Ela decorreu no Porto, onde nasceu e onde tem as suas raízes familiares, passou a sua infância e parte da adolescência no paraíso do Lobito, onde a liberdade e o contacto com o sol, a areia, o mar e uma natureza luxuriante lhe abriram horizontes. Aos 12 anos acompanhou os pais nas férias na Europa. No Museu do Prado descobre a pintura de Goya, Os Desastres da Guerra, e o seu destino ficou traçado ao decidir que a pintura seria o seu caminho. Anos mais tarde regressou ao Porto para frequentar a Escola de Belas Artes e viveu na quinta da família materna, de que tem muito boas memórias. Viveu em Luanda, onde casou e nasceu o seu filho. Conheceu a guerra e os seus massacres. Com o filho ao colo e o coração despedaçado, com o desaparecimento do mundo que a viu crescer, partiu para Lisboa.
Novos desafios teve de enfrentar nesta nova vida. Continuou a pintar e realizou a primeira exposição individual, em 1973, em Lisboa. assistiu a uma revolução e com Helder Macedo, Eduardo Prado Coelho e João Vieira participou na criação da Secretaria de Estado da Cultura.
Em 1978 partiu para Paris, onde vive até hoje. Nesta cidade trabalhou no Departamento de Pedagogia do Centro Georges Pompidou, onde trabalhou durante seis anos como especialista do século XX. Continuou a pintar tendo exposto individualmente em Lisboa, Algés, Porto, Paris, Bruxelas, Gand, ou Tarascon. e participou em exposições coletivas de arte portuguesa e de arte internacional tanto em Portugal como no estrangeiro.
Em 2003 fizemos a exposição de Lisa intitulada I shall paint my nails red na galeria do Porto e, em 2004, na galeria de Lisboa. Valter Hugo Mãe escreveu uns poemas que, antes mesmo de as ver, eram uma leitura perfeita das pinturas. Rogério Samora ficou tão impressionado com a exposição que baseou a sua personagem da peça Ricardo III nas figuras perturbadoras com os inquietantes olhos, maiores do que as órbitas, de quem foge do terror.
Começa a escrever com um sentimento de urgência e, em 2017, publica em Paris
L’Anniversaire, em 2018, em Lisboa, a versão portuguesa Apaga tudo não esqueças nada, em 2021, em Paris La fin de l’Éternité e Summertime e, em 2022, Lisbonne. Em 2023 os livros, que agora estamos a apresentar, da trilogia portuguesa escrita em português – O Vestido, Kitch e Retrato de Eva Friedman.
Escreve sobre as figuras tutelares da sua vida – o pai, engenheiro dos Caminhos de Ferro de Benguela, foi um apaixonado pela cultura africana, sobretudo a arte e filosofia Banto, que pesquisou. A sua biblioteca de 1300 volumes de estudos africanos e o espólio da sua investigação foram doados, este mês, pelos seus filhos à Biblioteca Nacional. A mãe muito elegante, culta e com vocação artística dizia-lhe – Vai minha filha, não tenhas medo de ser mulher, de ser artista, serás capaz de ser tudo isso e muito mais.
No Lobito foi muito feliz na sua primeira casa em madeira do princípio do século XX em cima da praia, com um jardim de acácias vermelhas e uma casa de bonecas. Uma noite acordou com o corpo coberto de formigas com asas e toda a casa tinha sido invadida por elas. A casa teve de ser queimada com todo o seu conteúdo. O seu primeiro grande desgosto com tão grande perda.
Alguns anos mais tarde também a quinta da família materna no Porto, em virtude de partilhas, lhe foi interdita. As suas memórias de infância foram-se perdendo.
Em 2021 sofreu mais um grande desgosto. Lisa tinha guardado para si as suas pinturas favoritas que depositou num cofre de um armazém. Trinta e oito pinturas foram roubadas e postas à venda na Internet. Lisa viu assim desaparecer uma parte muito importante da sua criação artística. Recorreu à justiça mas esta não foi feita após um processo de quatro anos.
Mas o seu desejo de sobrevivência é enorme, sempre pronta a deixar para trás o infortúnio e as adversidades e partir para uma novo desafio. Apesar de todos os desaires a vida continua.
As personagens da Trilogia portuguesa – Constança, Júlia e Eva Friedman – são mulheres fortes que enfrentam a dureza da vida, sobrevivem a lutos, a amores e desamores, a guerras, a êxodos mas olham a vida de frente e lançam-se em novos desafios com sucessos e fracassos.
A sua escrita é muito visual, contida, incisiva e precisa.
Este mês de Maio é muito importante na vida de Lisa – deixa a biblioteca e o legado do seu pai em boas mãos, volta à sua cidade natal e apresenta os seus livros, escritos em português, no Museu Soares dos Reis, uma referência na sua vida.”
in: apresentação da trilogia, por Drª Maria Arlete Alves da Silva, diretora da Galeria 111 e do CAMB – Centro de Artes Manuel de Brito, 20 de maio 2023